Opinião: Convocação do CNJ

 

Tudo vale a pena se a alma não é pequena.

Fernando Pessoa

 

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Na consciência esclarecida da sociedade civil, não resta dúvida de que a Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010) constituiu o avanço mais consistente, ao curso da experiência republicana, na moralização da vida pública. A inovação legal, como todos sabemos, fechou as portas das instituições de candidatos condenados em orgãos colegiadas da Justiça. Assim, o impedimento não atinge apenas postulantes a cadeiras no Congresso Nacional, mas, também, candidatos a deputados estaduais, vereadores e ao governo executivo.


Todavia, a Lei da Ficha limpa é instrumento jurídico limitado. Não favorece a desinfecção completa do aparelho político-administrativo, conforme exige a coletividade nacional. Coerente com os anseios éticos que, a cada dia, ganham visibilidade perante entidades civilizadoras, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estendeu ao Judiciário a aplicação do novel diploma legal. Mediante resolução específica, proibiu aos tribunais e demais órgãos da Justiça admitirem pessoas para cargos de livre nomeação manchadas por condenações em segunda instância. Apenas o Supremo Federal, corte acima da jurisdição do CNJ, não está compelido a acatar a decisão.


Compõem o universo burocrático alvejado pelo CNJ os ocupantes de cargos de confiança, funcionários comissionados e terceirizados. Vale dizer, o ato alcança servidores contratados à margem de concurso público, portanto a descoberto da garantia de efetividade. Os concursados ficaram à margem das restrições porque a decisão de afastá-los compete a eventual legislação aprovada pelo Congresso Nacional.


Em todas as traficâncias com recursos dos cofres oficiais que estarrecem os brasileiros há sempre conivência de comissionados, de assalariados terceirizados e titulares de função de confiança não requisitados dos quadros permanentes da administração. É o que ocorreu nas fraudes em licitações para compra de remédios e hemoderivados destinados ao Ministério da Saúde (Máfia dos Vampiros — 1990 a 1998); no episódio de desvio de dinheiro para aquisição de ambulâncias (Operação Sanguessuga — 2006); apropriação criminosa por parlamentares de receitas do orçamento da União (Operação Anões do Orçamento — 1993). Aqui citam-se apenas as trapaças mais notórias, sem apontar a maior delas Mensalão — 2005).


O exemplo do CNJ é mais que convite — na verdade, uma convocação — para que o Executivo adote a medida saneadora. É nele que sucede (com inexcedível frequência) o envolvimento em escândalos de corrupção de auxiliares não submetidos a certames oficiais para se habilitarem ao ingresso no serviço público. Convocação, adite-se, extensível ao Poder Legislativo.

Autor: JOSEMAR DANTAS
Correio Braziliense - 17/12/2012

JOSEMAR DANTAS É EDITOR DO SUPLEMENTO DIREITO & JUSTIÇA, MEMBRO DO INSTITUTO DOS ADVOGADOS BRASILEIROS

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