O que é Falsidade Ideológica?
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Cecília Meireles
A fim de esclarecer a falsidade ideológica diferenciando-a da falsidade material, necessário se faz transcrever as palavras do Nobre Jurista, Damásio de Jesus:
“Na falsidade material o vício incide sobre a parte exterior do documento, recaindo sobre o elemento físico do papel escrito e verdadeiro. O sujeito modifica as características originais do objeto material por meio de rasuras, borrões, emendas, substituição de palavras ou letras, números, etc. (...) Na falsidade ideológica (ou pessoa) o vício incide sobre as declarações que o objeto material deveria possuir, sobre o conteúdo das idéias. Inexistem rasuras, emendas, omissões ou acréscimos. O documento, sob o aspecto material é verdadeiro; falsa é a idéia que ele contém. Daí também chamar-se ideal. Distinguem-se, pois, as falsidades material e ideológica.” (Damásio E. de Jesus, in ‘Código Penal Anotado’, ed. Saraiva, 1994, p. 771)
Neste sentido, observamos que a falsidade ideológica atinge somente as declarações constantes no documento e não a autenticidade deste, que poderá ser verdadeira.
Assim é a redação do artigo 299 do código penal:
Art. 299. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante.
Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa, se o documento é particular.
Parágrafo único. Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.
O tipo penal tem como objeto jurídico a proteção da fé pública, preservando a veracidade das informações contidas nos documentos públicos ou particulares.
O sujeito ativo do delito poderá ser qualquer pessoa e sendo funcionário público este terá sua pena aumentada, conforme determina o parágrafo único do artigo. O sujeito passivo é o Estado bom como a pessoa prejudicada pela em razão da falsidade.
Nota-se que são três as modalidades de condutas praticadas pelo agente sendo, a de omitir, inserir ou fazer inserir declaração falsa no documento.
Na omissão de declaração o agente deixa de relatar, não menciona, oculta fato que era obrigado a fazer constar.
Na conduta de inserir o agente declara de forma falsa ou diversa da que devia ser escrita.
Já na conduta de fazer inserir o agente atua de forma indireta, utilizando-se de terceiro para introduzir no documento a declaração falsa.
Há de se consignar que para a configuração do delito de falsidade ideológica torna-se requisito essencial que a falsidade seja capaz de enganar e que seu objetivo seja relevante pois um equivoco ou uma mentira despropositada não serão suficientes à caracterização do crime.
Neste sentido é o entendimento jurisprudencial abaixo:
“Para a caracterização do delito de falsidade ideológica é mister que se configurem os quatro requisitos componentes do tipo penal, a saber: a) alteração da verdade sobre o fato juridicamente relevante; b) imitação da verdade; c) potencialidade de dano; d) dolo. Se não há na ação dos agentes entrelaçamento desses requisitos, relevância jurídica do falso dano efetivo ou mesmo potencial e, ainda dolo (porque o falso decorre de simples erro), não está caracterizado tal crime. E o remédio heróico pode validamente ser impetrado para, em tais circunstâncias, trancar a ação penal.” (TJSP – HC 398.375-3/0-00 – Rel. Des. MARIANO SIQUEIRA – 1ª C. Crim. – J. 4.11.2002 – Un.) (RT 812/555).
O crime de falsidade ideológica é doloso consistente na vontade livre e consciente do agente em omitir, inserir ou fazer inserir a falsidade objetivando prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade. Na modalidade culposa é descartada.
Consuma-se o delito com a efetivação de umas das três modalidades de condutas acima descritas e sua tentativa é admitida salvo na modalidade de omitir declaração.
Por fim, esclarece-se que a ação penal é pública incondicionada, devendo ao Estado prestar sua tutela jurisdicional compelindo o agente as penas previstas.