Empresas já empregam mais que o setor público em Brasília

 

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Pesquisa aponta que a área privada representa 52,4% da mão de obra empregada, um recorde. Em 20 anos, o Estado aumentou as vagas em 40%, enquanto os empresários tri­plicaram a oferta



Na capital dos concursos, o percentual de trabalhadores em empresas atingiu 52,4% da mão de obra empregada, um recorde histórico. Em 20 anos, o Estado aumentou em 40% o total de vagas, enquanto os empresários triplicaram os postos de trabalho



A cidade dos servidores públicos começa aos poucos a se redescobrir. Se Brasília virou o símbolo do funcionalismo pela quantidade de profissionais que vieram desde a fundação para trabalhar no governo instalado no centro do Brasil e pela profusão de concursos públicos, essa marca passa por profundas modificações. Hoje, o empregado que vive no Distrito Federal não está somente nos ministérios, nas administrações ou no Judiciário. Pelo contrário, está principalmente no comércio e no setor de serviços. Tanto que o índice de ocupados na iniciativa privada atingiu o mais alto patamar nos últimos 20 anos e soma mais da metade dos assalariados (52,4%), de acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).

No início dos anos 1990, tanto o setor público quanto o privado empregavam, cada um, a média de 30% dos assalariados do Distrito Federal. Em 1993, por exemplo, 34% da mão de obra estava em empresas particulares e 31,8% na administração pública. Dez anos depois, esse cenário começou a passar por mudanças. A partir de 2000, a porcentagem de funcionários públicos já tendia a se distanciar da dos empregados privados.

Em 2003, a participação do setor público caiu para 25,9% e o setor privado representou 41,7% da mão de obra empregada. Agora, a relação é de 22,3% e 52,4%, respectivamente. A diferença, hoje em 30,1 pontos percentuais, nunca foi tão grande (veja gráfico). "Nesse período, houve a redução nos serviços públicos por causa das políticas do então presidente Fernando Henrique Cardoso. Mas essa quantidade foi reposta nos governos do Partido dos Trabalhadores. Depende da linha política", analisa Jorge Fernando Pinho, professor da Universidade de Brasília (UnB).

Mesmo com o crescimento de concursos públicos e as contratações realizadas nos oito anos do governo Lula, as vagas criadas nas administrações federal e local não cresceram no mesmo ritmo da demanda do setor privado. "Não há estagnação no setor público. O que ocorre é que as vagas no Estado surgem em uma velocidade menor que no privado", explica Júlio Miragaya, presidente da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan).

Em março de 1993, o Distrito Federal tinha 201 mil servidores. Vinte anos depois, são 283 mil, o que representa um aumento de 40%. Já no setor privado, a quantidade de funcionários triplicou, saltando de 210 mil para 653 mil no mesmo período — incluídos os trabalhadores com e sem carteira assinada. Levando-se em conta apenas os empregados formalizados, o crescimento é ainda maior. Eram 164 mil há 20 anos. Hoje, são 554 mil, um aumento de 237,8%.

Segundo a coordenadora da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) do Dieese-DF, Adalgiza Amaral, o funcionalismo público passa por uma estagnação natural. Nos últimos 12 meses, o total de vagas ofertadas pela administração pública encolheu em 4 mil postos. "Se você perceber, os editais dos novos concursos, eles estão ofertando um número cada vez menor de vagas", afirma.

Contra a maré
Para Adalgiza, por mais que tenha crescido a participação do setor privado como gerador de empregos, eles ainda estão muito concentrados nos setores de comércio e de serviços, com postos de remuneração média mais baixa. "Setores como a indústria, que criam empregos de renda maior, e para profissionais mais qualificados, representam pouco na economia do DF. É preciso diversificar a produção para que o emprego na iniciativa privada seja de qualidade", afirma.

Na cidade onde fazer concurso público é sinônimo de estabilidade e bom salário, Flávia Carvalho, 38 anos, nadou contra a corrente e agora faz parte das estatísticas de pessoas que estão apostando na iniciativa privada. Há cinco anos, ela passou em um concurso do Banco de Brasília (BRB). Foi chamada dois anos depois, chegou a se apresentar, mas preferiu não tomar posse. A opção não se deu porque ela trabalhava em uma grande empresa ou em uma multinacional. A escolha dela foi ficar em uma pequena empresa. "Eu já tinha trabalhado com o meu chefe atual e estava em um bom cargo, como gerente-geral. Analisei o salário, o que me fazia bem e vi que não compensava", conta.

Atualmente, Flávia administra as três padarias da rede, sendo uma no Colorado e as outras duas no Sudoeste. São 70 funcionários na sede, 7,5 mil pães diários e o fluxo de caixa das três unidades. "Para ser uma boa administradora, tem que entender de tudo o que passa pela empresa, da cozinha ao caixa, e sempre com um bom relacionamento com as pessoas", ensina.

Colaborou Mariana Laboissière

Recordista
Embora a taxa de empregos na administração pública tenha diminuído, no Distrito Federal, o índice ainda é disparado a maior do país. Nas outras regiões metropolitanas, a taxa fica abaixo dos 20%. Em Porto Alegre, por exemplo, 17,2% dos trabalhadores são servidores. Em Salvador e Fortaleza, os números são ainda menores: 9,3% e 7,1%, respectivamente

Para saber mais

Fenômeno da formalização
Um dos motivos do crescimento dos assalariados no setor privado no Distrito Federal está relacionado também à onda formalizadora pela qual a capital do país passou. Para a coordenadora da PED, Adalgiza Amaral, a redução na quantidade de autônomos e o aumento dos trabalhadores na iniciativa privada indicam essa realidade. "Nos últimos 12 meses, tivemos uma queda de 18 mil autônomos e o aumento de empregadores donos de negócios familiares", analisa.

Para o presidente do Sebrae-DF, Antônio Valdir Oliveira Filho, uma das explicações para esse fenômeno é a formalização dos empreendedores individuais, incentivada a partir de 2011. O DF é, proporcionalmente, a unidade da Federação com o maior percentual de empreendedores individuais. São 55 mil, e a perspectiva do Sebrae é que esse número suba para 60 mil até o fim do ano. "São pessoas que saíram da informalidade, estão com proteção previdenciária e emitindo nota fiscal", comemora Valdir.

A empresária da área de estética Márcia Seixas, 39 anos, aderiu à categoria de empreendedora individual há dois anos. Ela trabalhava como massoterapeuta em casa e prestava serviços fora. Um dos trabalhos era de prática laboral em uma agência do Banco do Brasil. Porém, a instituição exigia nota fiscal. Foi aí que ela abriu a empresa —— há dois meses saiu de casa e abriu a própria loja. "Nunca tive carteira assinada. Só agora tenho os direitos previdenciários e as orientações para tocar o meu negócio. Antes, misturava o dinheiro de casa com o da loja, uma confusão", conta. (FM)

Não há estagnação no setor público. O que ocorre é que as vagas no Estado surgem em uma velocidade menor que no privado"
Júlio Miragaya, presidente da Codeplan

Os maiores polos
Os motores para o crescimento da geração de empregos no setor privado no Distrito Federal são, principalmente, os segmentos de comércio e de serviços. Segundo dados da Codeplan, 24,9% dos trabalhadores do DF estão no comércio. Em serviços, são 35%, incluídas atividades como transporte, educação, saúde, bancos, informática e domésticos. O presidente da Fecomércio-DF, Adelmir Santana, acredita que a absorção da mão de obra no comércio é reflexo do poder de consumo da capital.

Na avaliação de Santana, como o parque industrial de Brasília não é consolidado, quem não está no setor público acaba tendo o comércio como opção de trabalho. "No nosso Estado, o setor público ainda é muito grande. Mas por conta de Brasília ser a capital e o centro das decisões políticas, a tendência é de que o setor privado continue crescendo cada vez mais para atender a demanda gerada por esse segmento", afirma.

A indústria de transformação — excluindo a construção civil — emprega só 1,3% da mão de obra e é um setor que sofre fortes oscilações mensais. "Na análise dos últimos 20 anos, o setor expande e cria oportunidades quando tem algum tipo de incentivo do governo. Se não tem, as vagas somem", analisa Diones Cerqueira, economista da Federação das Indústrias do Distrito Federal (Fibra).



Autor(es): FLÁVIA MAIA
Correio Braziliense - 05/05/2013

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