Empregos - Procuram-se especialistas
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Galileu Galilei
Escassa no país, mão de obra especializada é sonho de recrutadores. Mas onde estão os profissionais qualificados?
Na corrida por um emprego, o profissional com características técnicas larga com vantagem. Ou melhor, nem precisa sair do lugar. A carência por mão de obra especializada é grande, e determinados perfis de trabalhadores são cada vez mais cobiçados pelas organizações. Levantamento feito pela empresa de recrutamento Page Personnel listou os 12 trabalhadores mais escassos no país (ver quadro). A busca não é simples, e pode demorar até 120 dias para finalmente encontrá-los.
A principal justificativa para tamanha escassez é a falta de qualificação. “Há um abismo muito grande entre as escolas de formação, tanto de ensino técnico quanto superior, e as necessidades das empresas”, lamenta Luis Fernando Martins, gerente executivo da Page Personnel. Para Martins, até existem profissionais formados, mas poucos são aptos a assumirem as funções. “As escolas precisam proporcionar não apenas o ensino acadêmico, mas também a prática, por meio de estágios. O aluno tem que colocar a mão na massa”, defende.
Para o gerente executivo da unidade de estudos e prospectiva da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Luis Caruso, o problema tem raízes ainda mais profundas: começa na educação básica. A baixa escolaridade e o péssimo nível em português e em matemática são constantes entre os candidatos. “Quando uma empresa recruta um profissional, ela exige que ele demonstre um certo nível de leitura, que saiba se comunicar”, explica Caruso. Ou seja, são habilidades que, mesmo para aqueles que possuem o conhecimento técnico, ainda são difíceis de encontrar.
No entanto, a busca por qualificação não parte apenas do profissional. Os empregadores também precisam investir na especialização de seus funcionários. “Essa mão de obra não é formada da noite para o dia e a jornada de trabalho atual impossibilita o trabalhador a se reciclar”, pontua Artur de Camargo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação e Afins (CNTA).
Outro fator importante na opinião de Camargo é a alta rotatividade de profissionais. A remuneração de muitos deles é elevada, mas nem todos estão dispostos a pagar pelo serviço. “Várias empresas trocam o trabalhador especializado para economizar e, a longo prazo, isso acaba tendo um reflexo”, afirma o especialista.
Formação
Controlar a produção, desde o começo até o fim, garantir que as máquinas funcionem, e coordenar equipes: essas são as funções do supervisor de produção, profissional que, de acordo com a pesquisa, é o mais raro no mercado. A falta de pessoas capacitadas para a atividade é compreensível. “O supervisor de produção, além de dominar a parte técnica, tem que saber lidar com as pessoas. É cobrado pela qualidade da produção, mas não é ele quem a realiza”, explica Caruso.
Para Joaquim Gonzaga, 47 anos, supervisor de produção há 24 anos em uma fábrica de refrigerantes, a qualidade realmente necessária é a liderança. “O difícil não é estar às voltas com máquinas e relatórios, mas lidar com o ser humano, a peça fundamental. São várias pessoas com comportamentos diferentes, e você tem que tirar o melhor delas”, conta Gonzaga. Segundo o profissional, também é complicado encontrar trabalhadores habilitados para o cargo devido à falta de uma formação específica para o setor. “Não existe uma escola para isso. Todos os supervisores que conheço se formaram dentro das próprias empresas”, diz.
Essa falta de cursos disponíveis para especialização não é exclusividade do cargo. O técnico de campo, que ficou em segundo lugar na pesquisa, também é um profissional carente de formação. Na empresa de maquinário agrícola onde trabalha o técnico de campo Nivaldo de Souza, 50 anos, os contratados para a função recebem treinamento interno. Souza também é o gerente responsável pela contratação e garante ser mesmo muito difícil encontrar esses profissionais. “O treinamento é longo e a tecnologia tem avançado rápido. Muitas pessoas não conseguem acompanhar e desistem”, conta.
Roberto Campos, 32 anos, aproveitou a falta de mão de obra para crescer profissionalmente. Há cinco anos, ele começou a trabalhar na mesma empresa de Nivaldo, como estoquista de peças. A necessidade de técnicos o impulsionou a aprender o ofício e, hoje, ele também é gerente de uma loja. Para ele, a principal razão de tamanha escassez é o preconceito. “Ainda existe o mito de que o técnico mecânico é uma profissão desqualificada, que não exige conhecimento”, argumenta, “mas a tecnologia está se desenvolvendo e requer cada vez mais capacitação.”
Devido ao desconhecimento do assunto e à longa duração do treinamento, é mesmo complicado encontrar jovens que queiram investir na área. Segundo Luis Caruso, a preferência ainda é por cursar uma faculdade em vez do curso técnico. A esperança do especialista é de que a remuneração comece a atrair novos profissionais. “Muitas carreiras técnicas e especializadas apresentam o salário de admissão maior do que uma ocupação de nível superior”, garante.
Novos profissionais
Além de contar com aptidões técnicas, profissionais analíticos e com visão estratégica são bem cotados, seja qual for o cargo. Para o especialista em inteligência de mercado Lucas Aragão, a maior dificuldade é encontrar, além de especialistas nos assuntos, bons comunicadores, que saibam interpretar e transmitir o significado dos dados de mercado. Com a popularização do comércio eletrônico, também é necessário que os profissionais saibam identificar e traduzir tendências no plano virtual. “Na internet, a informação é mais aberta, há um volume muito maior de informação e dados para destrinchar”, resume Aragão.
Correio Braziliense - 13/01/2013