Sobra emprego para qualificado
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Calvin Coolidge
Foi-se o tempo em que o pedreiro e eletricista Jorge Luís Oliveira Barroso, 40 anos, aceitava o preço que lhe impunham pelos serviços realizado. Hoje, ele é quem dita os valores. "Não há profissionais no mercado. Por isso, pagam qualquer quantia pelo meu trabalho", justifica. Além de ser fichado em uma construtora, ele faz alguns bicos. "Consigo tirar até R$ 1,8 mil por mês, mais que um vendedor. Comida não falta lá em casa", conta, orgulhoso.
A história de Jorge é comum no Distrito Federal. Embora 159 mil brasilienses ainda estejam desempregados, sobram vagas no mercado de trabalho para quem se qualifica, estuda e tem habilidades. Hoje, 1.847 vagas de emprego que não exigem sequer o ensino fundamental estão ocupadas na capital. O número salta para 478.707 em postos que pedem funcionários com o ensino médio completo. Quem tem o ensino superior ocupa 303.729 postos.
Especialistas avaliam que alguns setores não conseguem preencher nem sequer metade dos postos oferecidos — seja por falta de mão de obra ou por salários muito baixos, o que desanima o possível candidato (veja quadro). Em compensação, algumas áreas já estão saturadas, ou seja, têm mais profissionais que ocupações no mercado.
Segundo analistas ouvidos pelo Correio, estão em alta as profissões ligadas ao desenvolvimento, como construção civil e informática. Brasília também carece de empregados domésticos. Os setores de comércio e serviços ainda estão entre os que mais crescem ano a ano e, em consequência, demandam trabalhadores. A geração de vagas ligadas ao meio ambiente continua tímida na capital do país, mas promete saltar nos próximos anos.
Excessos
Em contrapartida, profissionais de turismo e comunicação, por exemplo, têm mais dificuldade de encontrar emprego. Por conta da alta oferta de cursos, a cidade tem um grande número de advogados. "No caso do direito, o sistema é diferente. Como a capital oferece muitas vagas para a carreira pública, a maioria dos estudantes consegue se colocar neste mercado. Além disso, há uma deficiência na formação destes trabalhadores. Muitos não conseguem passar no exame da Ordem dos Advogados do Brasil, por isso não exercem a profissão", pontua Vanderli Frare, especialista em gestão de pessoas e planejamento de carreira do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec).
De acordo com a Relação Anual de Informações Sociais (Rais), do Ministério do Trabalho, a indústria de mineração apresentou o maior crescimento de estoque de empregos em 2011, com alta de 16,15% — um total de 489 postos no DF. Serviços, entretanto, registrou a maior elevação em números absolutos, com 30 mil vagas a mais, em relação a 2010, e totalizou 439 mil oportunidades. Construção civil escalou 11,95%: são 70.842 postos no total. Já o setor de serviços industriais de utilidade pública — que engloba as profissões ligadas à distribuição de energia e coleta seletiva, por exemplo, teve queda de 17,02%, que representa 975 ocupações retiradas do mercado de trabalho.
Segundo dados da Secretaria de Trabalho do DF, foram oferecidas 50.590 vagas pela Agência do Trabalhador e apenas 10.618 pessoas foram contratadas. No total, apenas pelo cadastro, sobraram 39.972 postos. "Isto não significa que elas não foram preenchidas. Provavelmente, muitas empresas conseguiram contratar de outra forma, anunciando no jornal, ou por indicação", explica o subsecretário de Atendimento ao Trabalhador e ao Empregador e coordenador do Sistema Nacional de Emprego (Sine) do DF, José Eduardo Correa.
Falta qualificação
Correa conta que a maior dificuldade do mercado de trabalho do DF é a falta de qualificação. "A maior parte dessas vagas não é preenchida por falta de pessoas das quais os perfis encaixam, principalmente em áreas técnicas, como eletricista ou lanterneiro. Além disso, postos que oferecem remunerações muito baixas também têm dificuldades de encontrar empregados, acredito que pelo alto custo de vida de Brasília", comenta.
Além disso, a capital tem algumas particularidades em relação ao mercado de trabalho. "O nível educacional é muito elevado, se compararmos com o restante do país. Por isso, empregos que exigem baixo nível educacional não são muito procurados. Podemos dizer que faltam pedreiros e empregados domésticos, por exemplo. Por isso, esses profissionais chegam a ganhar mais que caixa de loja ou vendedor. Por outro lado, a engenharia também é uma área com escassez de mão de obra, porque exige qualificação maior, o curso é mais difícil", diz o subsecretário.
Para o analista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Daniel Biagioni, a escolha do candidato, muitas vezes, é relacionada ao prestígio social. "Mesmo que uma profissão como empregado doméstico pague melhor, muitas pessoas preferem ser vendedores, por exemplo, por conta do status. Às vezes, também, é uma escolha da família. Os próprios pais não querem que o filho ingresse em determinada carreira", conclui.
Autor(es): » LARISSA GARCIA
Correio Braziliense - 28/12/2012