Faltam técnicos com habilidades para gestão
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Salústio
Formado em matemática e eletrônica, Jaílson José de Queiroz começou sua carreira na IBM como assistente técnico há 23 anos. Após diversas promoções dentro do nível operacional e uma expatriação para os Estados Unidos, ele foi convidado a assumir seu primeiro cargo de gestão em 2005, em uma filial de Minas Gerais. Mas a evolução da carreira administrativa não parou por aí. Desde 2010, ele ocupa o cargo de gerente sênior de manutenção e serviços da multinacional em São Paulo, coordenando o trabalho de mais 14 gerentes. "Nunca me imaginei gerente. Gosto muito da área técnica e achei que seguiria carreira dessa forma", conta.
No entanto, como acumulava duas décadas de conhecimento em relação às linhas de produtos e à cultura da empresa, além de demonstrar habilidades para coordenar outras pessoas, foi reconhecido como um "líder potencial". A partir daí, recebeu uma série de treinamentos para que aprimorasse aptidões de gestão. "Quando se é um especialista, os seus resultados dependem apenas de você. Mas, como gestor, sou responsável também pelo desempenho de cada um da minha equipe", afirma.
Segundo ele, foi preciso aprender a lidar com os potenciais e as limitações de todos para alavancar a performance do grupo. Sem os conhecimentos técnicos, entretanto, Queiroz acredita que não conseguiria superar os entraves da gestão. "Hoje coordeno outros gerentes, uma tarefa complexa, pois parte dos meus subordinados é até mais experiente que eu", diz. Para continuar crescendo na carreira ele começará uma pós-graduação em gestão em 2013, paga pela empresa.
Casos como o de Queiroz têm se tornado o centro das políticas de sucessão das empresas de TI, uma vez que encontrar esse perfil é ainda um dos maiores desafios do setor. Segundo pesquisa da Korn/Ferry, é justamente na média gerência que está a maior escassez de talentos em TI. O levantamento foi realizado com 4 mil profissionais de 21 empresas globais como Microsoft, Linkedin, HP, Cisco e IBM.
Ao mapear o "índice de agilidade de aprendizado", que mede a capacidade que os profissionais têm de utilizar conhecimentos anteriores para solucionar novos problemas, a consultoria constatou que, em média, gerentes de TI apresentam uma das menores taxas do mercado. Enquanto esse profissional possui um "índice de agilidade de aprendizado" em torno de 46 pontos, os seus pares nos ramos de comunicação (55), serviços financeiros (51) e bens de consumo (51) estão bem à frente. Contudo, a condição do analista de TI, nível considerado operacional, é oposta: a pontuação desses profissionais chega a 51 - o patamar mais elevado entre os seus pares nos setores pesquisados.
Os dados parecem contraditórios à primeira vista, mas, segundo Jairo Okret, sócio-diretor sênior de tecnologia da Korn/Ferry no Brasil, isso acontece porque o analista que possui grande potencial de aprendizado é logo fisgado pelo mercado, forçando a companhia a promover técnicos que ainda não desenvolveram as competências necessárias para o cargo de gestão. "No mundo ideal, um analista talentoso viraria gerente e, eventualmente, diretor e presidente", explica. No segmento de TI, porém, esse profissional acaba sendo assediado e se tornando um executivo de destaque em outra empresa. "Existe, assim, um gap entre o índice de analista e o de gerente dentro da mesma companhia".
Jaílson Queiroz começou na IBM como assistente técnico, mas depois seguiu carreira na área de gestão na companhia
No caso do índice do analista ser mais elevado que do gerente, Okret justifica que a diferença está no processo de recrutamento e seleção das companhias, que buscam os técnicos mais qualificados desde a fase de estágio. Além disso, a pesquisa mostra que a alta gerência do setor (diretores e presidentes) possui um índice de agilidade de aprendizado de 59 pontos, atrás apenas dos seus correspondentes do setor de bens de consumo (62). "Os dados refletem que os principais executivos das companhias de TI vêm de fora, já desenvolvidos em outras empresas", afirma. Okret diz que em um mercado que valoriza criatividade, rapidez e domínio das ferramentas tecnológicas, enxergar a capacidade de liderança desde o início da carreira dos colaboradores e investir na retenção deles é essencial para minimizar o problema.
Ao notar que 40% dos seus principais executivos vinham de fora, a HP passou a investir mais na retenção do que chama de "top talents" nos últimos dois anos, período em que conseguiu reduzir esse índice para 30%. "A saída de profissionais de alta performance é uma perda inestimável. Passamos a apostar mais nos planos de carreira, baseados em políticas de desempenho e meritocracia", diz Antonio Salvador, vice-presidente de RH da empresa. Em dois anos, o turnover dos chamados "top talents" caiu de 10% para 4%.
De acordo com Salvador, trazer executivos de fora também é importante para oxigenar as operações, mas promover internamente é uma maneira mais eficaz para revitalizar os negócios e motivar os talentos a continuar na corporação.
O programa Novos Gestores da HP destaca profissionais de alto potencial a cada análise anual de desempenho. Os eleitos têm uma parte de sua jornada diária de trabalho reservada para treinamentos com foco no desenvolvimento de habilidades gerenciais. Para tanto, é importante que as empresas da área ofereçam também a chamada carreira em Y. "Não podemos perder um bom técnico pelo fato de ele não querer, ou não ter o perfil, para assumir um cargo de gestão", pondera Salvador, da HP. Nesse caso, o funcionário precisa de espaço para crescer no nível operacional.
Na Cisco Systems, onde metade dos principais executivos vieram do mercado, a percepção de que é preciso investir mais na qualificação de futuros líderes também existe. O diretor de RH da companhia no Brasil, Silvio Paciello, afirma que a escassez de talentos é um entrave para o mercado de TI. "Nem sempre um profissional que domina ferramentas tecnológicas é ou quer ser um bom gestor. Quando esse perfil é identificado, porém, a companhia treina e capacita o técnico para um futuro cargo de liderança", diz.
Após serem mapeados internamente, os talentos são convidados a diversos tipos de treinamento, presenciais ou on-line, por cerca de dois anos. "Eles também participam de reuniões com líderes globais da organização, para que convivam com as atividades de um executivo e desenvolvam habilidades de gestão de projetos e de pessoas", afirma Paciello.
Já na IBM do Brasil, o índice de executivos importados de outras empresas é de até 30%, dependendo da área de negócios. "Não é possível reter todos, mas a capacitação independe disso. Precisamos investir na formação dos profissionais, sejam eles diagnosticados como bons líderes ou bons técnicos", afirma Adriana Vasconcellos, líder de recrutamento.
Segundo Werner Penk, líder global de tecnologia da Korn/Ferry International, as empresas que não selecionam ou desenvolvem talentos para liderança correm o risco de perder competitividade. "Se a companhia não tem ninguém para promover para um cargo sênior, é obrigada a contratar de fora. Com isso, tanto a média gerência quanto os profissionais técnicos passam a sentir que não há futuro na atual posição", afirma.
Autor(es): Por Carolina Cortez | De São Paulo
Valor Econômico - 26/11/2012